O site arbitragemcoimbra regressou com mais uma entrevista de grande nível como vem sendo hábito.
Desta vez escolheram o árbitro Madeirense Elmano Santos que termina no final da presente temporada o seu brilhante percurso como árbitro.
Conhecido pelos árbitros como pessoa divertida, trabalhadora e sempre pronta a ajudar quem precisa,Elmano Santos termina no final da presente temporada a sua carreira de árbitro e por isso o arbitragemcoimbra com esta entrevista faz-lhe o merecido reconhecimento e aproveita para dar a todos uma entrevista de luxo ao nível de outras já realizadas a vários árbitros da LPFP e Observadores...
Elmano Santos prontamente acedeu ao nosso pedido e com toda a simpatia respondeu objectivamente ás nossas questões ....
Assim em baixo deixamo-vos a entrevista :
Como foi a ascensão do Elmano Santos até atingir o topo da arbitragem nacional?
ES-Comecei muito novo a interessar-me pelo desporto e, como qualquer jovem, pela prática desportiva, neste caso o futebol. Como nunca ninguém queria ser árbitro nas competições escolares, passei a determinada altura a dedicar-me também a esta função. Nas várias épocas em que joguei futebol federado (até aos 20 anos) sempre colaborei na arbitragem dos jogos ao nível dos infantis. Ao fim de duas épocas como sénior, optei por dedicar-me à arbitragem pois senti que podia atingir um patamar que, como praticante, dificilmente alcançaria.
Aliás, este é um dos caminhos que temos de seguir ao nível da arbitragem. Fala-se muito nas dificuldades de recrutamento e fidelização ao nível da arbitragem mas não se permite que um jovem possa desempenhar simultaneamente duas funções (praticante e árbitro) optando mais tarde por aquela que melhor se enquadra nas suas motivações. O projecto "Árbitro Jovem" devia contemplar a possibilidade de um atleta juvenil / júnior poder ser árbitro de escolas / infantis, por exemplo.
Não ser árbitro do Continente foi entrave ou motivo para mais empenho?
ES-Quem vive longe dos grandes centros tem sempre mais dificuldade em aceder aos patamares mais elevados de uma dada actividade. No caso da arbitragem não é diferente. Os árbitros dos centros urbanos do litoral português levam vantagem não só porque o seu acesso à formação e à preparação estão facilitados mas também porque estão mais próximos dos locais de treino e competição despendendo menos tempo em deslocações. Isso faz com que os árbitros insulares (o mesmo acontece com alguns colegas do Continente, nomeadamente do interior do país) tenham que desenvolver um esforço suplementar na busca da formação que vise o desenvolvimento das suas competências pois têm mais dificuldades em contactar com colegas e com outros técnicos credenciados ao nível da arbitragem. Os poucos recursos humanos existentes acabam por abandonar pois é-lhes vedada a oportunidade de continuarem ligados ao sector, seja no dirigismo, seja na formação, por troca com indivíduos sem sensibilidade, visão estratégica e capacidade para fazer evoluir o sector, na maioria das vezes vindos dos clubes. Dou um exemplo: fui o 6º árbitro da Madeira a ascender à 1ª Divisão Nacional; dos 5 árbitros que me precederam nenhum desempenha funções ao nível da arbitragem. E depois disso já mais um saiu de cena. Isto sem contar com outros que andaram pela 2ª e 3ª Nacional e que poderiam ser elementos válidos para a arbitragem. Será que a arbitragem se poderá dar ao luxo de dispensar os seus recursos mais qualificados? O desenvolvimento das minhas competências poderia ter sido melhor e mais rápido se tivesse tido o acompanhamento mais adequado. Este é um caso paradigmático daquilo que ainda acontece em algumas zonas do país.
A sua profissão ligada ao desporto ajudou-o a ter sucesso na arbitragem?
ES-Naturalmente que sim. Se é verdade que tive muitas dificuldades ao longo da minha carreira em desenvolver competências muito específicas da arbitragem por falta de acompanhamento e contacto com os árbitros mais categorizados do nosso país, também é verdade que ao nível de alguns conhecimentos auxiliares como a psicologia, o treino, a pedagogia, a nutrição, a gestão, etc, fui beneficiado pela minha formação académica.
Tem algum jogo por si apitado que vá relembrar para sempre ?
ES-Relembro os meus jogos de estreia: 1986 - Estreito / Nacional (Iniciados); 1992 - C Indústria / Cacém (3ª Div); 1993 - Sintrense / Montijo (2ª Div); 2000 - V. Guimarães / B Mar (1ª Div) por terem marcado uma nova era na minha vida e na minha carreira. Não me posso esquecer também de alguns jogos do Porto e Benfica com 50 000 espectadores, ou mais, ou do prazer que foi acompanhar alguns colegas como 4º árbitro em jogos europeus, nomeadamente da Liga dos Campeões. Mas julgo sinceramente que o jogo inesquecível ainda está para vir.
Viajar todas as semanas para o Continente é mais um factor de desgaste ou não o afecta?
ES-O desgaste não é provocado pela viagem em si. Se tudo correr normalmente podemos chegar a casa ao mesmo tempo que colegas que se têm de deslocar entre Lisboa e Porto ou vice-versa. Para além de não termos de conduzir, viajamos num meio de transporte mais cómodo e seguro. O problema está nos horários, nos atrasos, nos cancelamentos dos voos. Fazer um jogo à noite implica passar duas noites fora de casa; os atrasos já me fizeram ir para um jogo com 3h de sono e sem equipamentos; os cancelamentos de voos pelo mau tempo já me obrigaram a passar 5 dias fora de casa. Isto sim, é desgastante.
O Elmano dirige o centro de treinos da LPFP na Madeira. Sente que este centro de treinos foi fundamental para si e para o Marco Ferreira e que a curto prazo pode ser uma rampa de lançamento de novos árbitros Madeirenses motivados por estarem na presença de dois árbitros de 1a categoria?
ES-Os centros de treino foram uma das medidas mais positivas que se implementaram nos últimos anos a par das modernas metodologias que neles se aplicam. No meu caso pessoal, mais do que a melhoria da qualidade do treino, fez aumentar os meus níveis de motivação pelo facto de treinar acompanhado. Se é verdade que no passado já utilizava boas instalações desportivas e aplicava boas metodologias de treino, o facto de treinar sozinho era um factor de desmotivação que, por vezes, afectava o correcto desenvolvimento das cargas, numa carreira que já vai longa. Esperemos que cada vez mais os árbitros percebam que este é um dos caminhos para o sucesso, independentemente de estarem ou não lá presentes referências da arbitragem nacional. Até porque o desenvolvimento dos treinos técnicos requer um número mínimo de árbitros que nem sempre conseguimos alcançar.
É o presidente da ATARAM . Para quem não conhece pode explicar resumidamente em que consiste esta associação e quais os seus objectivos ?
ES-A ATARAM (Associação de Técnicos de Arbitragem da Região Autónoma da Madeira) é uma associação de classe que representa todos os técnicos de arbitragem madeirenses de todas as modalidades desportivas, desde os juízes / árbitros aos formadores, passando pelos observadores / avaliadores e dirigentes da função. Possui actualmente 130 associados que pagam uma quota anual de 20 Euros (única fonte de receita da associação). Os seus objectivos passam pelo desenvolvimento de acções que contribuam para a dignificação da função, pela promoção desportiva, formativa, cultural e recreativa dos seus associados e pela dinamização de formas de cooperação com as estruturas sociais do desporto.
Pretendemos, assim, contribuir para a melhoria da qualidade da arbitragem regional através da criação de um modelo que auxilie as associações regionais em geral e os juízes / árbitros em particular desde a captação e retenção na função até à formação e preparação específica para os jogos / competições.
Possuímos um site (www.ataram.pt) onde divulgamos as nossas actividades (formativas e recreativas) e outras notícias de interesse para os nossos associados, os nossos parceiros e os benefícios de ser sócio, temos assento no Conselho Desportivo Regional, colaboramos com escolas, com a Universidade da Madeira, com o IDRAM, com instituições de solidariedade social, associações, clubes, comunicação social, etc. No caso específico do futebol, modalidade onde temos o maior nº de associados (mais de um terço), desenvolvemos um trabalho mais específico, idêntico ao que os núcleos desenvolvem a nível nacional onde para além das sessões técnicas teóricas temos desenvolvido um ciclo de workshops sobre colocação, movimentação e tomada de decisão com o auxílio de uma equipa de futebol (juvenis), porque entendemos que este modelo de formação prática, no campo, com jogadores de futebol, é o que mais se coaduna com as exigências actuais da arbitragem e aquele que maiores proveitos poderão trazer aos árbitros.
Está a terminar a sua longa carreira de árbitro. Podemos ver o Elmano futuramente num cargo da estrutura da arbitragem portuguesa?
ES-Depois de 25 anos ligado à arbitragem é natural ficar ligado ao sector. Apesar do desgaste que a carreira provoca, sempre me dediquei a ela com paixão pelo que pode não ser fácil abandoná-la por completo. No entanto, como profissional do desporto, poderão surgir outras oportunidades que não passem pela arbitragem e sejam incompatíveis com a mesma, até porque, em alguns casos, prejudiquei a minha vida familiar e profissional à custa desta actividade (apesar de não estar arrependido). Neste momento, ainda estou focado em terminar da melhor forma a minha carreira na 1ª Divisão. Se surgirem oportunidades e interesse por parte das organizações e das pessoas que lideram as mesmas, se acharem que o meu perfil é o mais indicado para desempenhar alguma função na arbitragem, naturalmente que irei analisá-las e decidir juntamente com a minha família das vantagens e desvantagens de desempenhar algum cargo, que poderá ir do dirigismo à formação, área onde gosto de trabalhar e onde já possuo também alguma experiência fruto das funções que tenho desempenhado nos últimos tempos. E se abraçar alguma dessas funções será com o mesmo empenho de sempre, aquele que levou um árbitro afastado dos grandes centros a manter uma carreira longa, a um nível relativamente elevado fazendo acreditar que é possível ter sucesso independentemente das condições de partida não serem iguais para todos.
O Elmano Santos é um forte candidato a dirigir a final da taça de Portugal ou a Taça da Liga porque termina a carreira de árbitro esta época. Seria terminar em grande?
ES-Não sei se serei um forte candidato porque esse não tem sido o critério seguido ultimamente, nem tem de ser. Há vários factores que poderão influenciar essa escolha: não ser internacional, desempenho da época, equipas finalistas, imagem junto da comunicação social... Mas naturalmente que, se me reconhecerem competência para tal, será terminar em beleza uma carreira de 25 anos, 19 deles como árbitro nacional (12 na 1ª Divisão), com mais de 100 jogos no escalão máximo e cerca de 500 a nível nacional. Aliás, estar no Jamor, foi um dos objectivos que tracei para esta época, nem que tenha que comprar bilhete. Há muitos anos que não assisto a uma final da Taça ao vivo...
Que mensagem gostaria de deixar a todos os árbitros e principalmente aos mais novos?
ES-Que se dediquem à arbitragem com paixão, empenho, dedicação e respeito pelos outros. Que trabalhem afincadamente: estudem, treinem, invistam na vossa formação, fundamentalmente no que pode contribuir para a vossa progressão na carreira. Não estejam à espera que alguém vos acompanhe, vos forme, vos defenda, pois isso é excepção na arbitragem. Desconfiem daqueles que vos fazem promessas fáceis. Não esperem ganhar dinheiro nos primeiros anos, antes pelo contrário, mas lutem por atingir patamares elevados onde as compensações financeiras já são atractivas.
Acreditem que está para breve o aparecimento de uma nova classe dirigente no futebol e na arbitragem em particular, que para além do voluntarismo que se reconhece à maioria dos actuais, traga novas mentalidades, não tenha medo da mudança, que faça o futuro acontecer não se limitando a reagir perante as transformações, que organize a arbitragem a partir das bases, preocupando-se com a reestruturação das metodologias usadas ao nível da formação inicial e contínua e do treino (formação por etapas, criação da figura de treinador do árbitro, etc), criando um sistema de avaliação de desempenho mais ágil, justo e transparente e de um código de conduta onde os aspectos éticos sejam privilegiados, trabalhando em equipa na busca do sucesso comum. Há 20 anos que espero por estas e outras mudanças. Não desisti. Não desistas também, pois a sociedade muda a uma velocidade vertiginosa e só sobreviverão os que forem capazes de se adaptar a essas mudanças.
http://arbitragemcoimbra.bloguedesporto.com
0 comentários:
Enviar um comentário